Referência:
The Realistic Spirit: Wittgenstein, Philosophy, and the Mind (Representation and Mind), (MIT Press, 2001, p. 44).
Na Galilean Library:
No Mickindex (Japonês) (via A Perspectiva da Primeira Pessoa Português)
DARLEI DALL'AGNOL
"Beliefs, in short, are rules for action." (William James)
Resumo: O trabalho discute a natureza dos juízos sintéticos a priori, tema central de uma semântica transcendental, associando-os ao que Wittgenstein considera proposições fulcrais. Em primeiro lugar, apresenta as diversas posições da filosofia analítica sobre a existência ou não desse tipo de juízo, incluindo a da semântica transcendental tractariana. Em segundo lugar, reconstrói as principais características desses juízos em Kant, salientando a sua necessidade, e mostrando que elas estão em conflito com alguns desenvolvimentos científicos contemporâneos. Em terceiro lu-gar, sustenta que através da concepção de proposições fulcrais, Wittgenstein nos apresenta uma descrição mais adequada de proposições que são verdadeiras independentemente da experiência no contexto de uma epistemologia falibilista.
Palavras-chave: Semântica transcendental. Juízos sintéticos a priori. Proposições fulcrais. Kant. Wittgenstein.
Endereço para baixá-lo:
ftp://ftp.cle.unicamp.br/pub/kant-e-prints/Proposi%E7%F5es%20fulcrais.pdf
http://www.geocities.jp/mickindex/wittgenstein/witt_blue_en.html
(i) Não-comprometidas [Non-committal] (atos de mero pensar): O pensamento que P pode ser entretido, apreendido, compreendido.
(ii) Assertóricas (atos de julgar): O pensamento que P pode ser julgado, negado, questionado, posto em dúvida.
(iii) Suposição (atos do suposição): O pensamento que P pode ser suposto, pressuposto, concebido, imaginado.
Quando nós perguntamos sobre nosso conhecimento de auto-atribuições psicológicas da forma: eu Φ que P, nossas respostas podem focar sobre três aspectos da pergunta, correspondendo aos três componentes da atribuição. Eu posso perguntar: (i) como eu sei que eu ΦP? (ii) como eu sei que eu Φ que P? , e (iii) como eu sei que eu Φ que P? A última pergunta, sobre como eu sei que P é o conteúdo de minha atitude, foi extensivamente discutida em anos recentes. Por exemplo, perguntou-se como, dado o anti-individualismo sobre o conteúdo, eu sei que eu tenho uma atitude com respeito à água ao invés de água-gêmea? Para as finalidades deste artigo suporei simplesmente que nós podemos explicar a autoridade que um sujeito tem sobre os conteúdos de suas atitudes apelando ao fato que, ao saber que atitude tem, o sujeito está re-utilizando uma habilidade pressuposta de pensar que P. São as primeiras duas perguntas, particularmente a segunda, que me interessarão: Como eu sei que sou eu, antes que alguma outra pessoa, que tem uma atitude em relação a P, e mais particularmente, como eu sei que eu ϕ, ao invés de φ, que P? É na tentativa de responder a essas perguntas que eu penso que a teoria do conhecimento baseada na capacidade de ação [ agency theory of knowledge] prova seu valor.
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A coronation is the picture of pomp and dignity. Cut one minute of this proceeding out of its surroundings: the crown is being placed on the head of the king in his coronation robes.—But in different surroundings gold is the cheapest of metals, its gleam is thought vulgar. There the fabric of the robe is cheap to produce. A crown is a parody of a respectable hat. And so on. ( PI, 584)
Uma coisa errada com a idéia da autoridade da primeira pessoa como uma questão de concessões sociais é que ela fornece uma imagem erroneamente permissiva mesmo do contexto social. Pois não é o caso, no final das contas, que simplesmente permitimos que o que as pessoas dizem sobre seu estado mental corrente passe sem o benefício da evidência, e que estamos relutantes em desafiar o que elas dizem. Ao contrário, a acessibilidade especial de primeira pessoa aos estados mentais parece ser não apenas algo que nós concedemos às pessoas, mas algo que é uma expectativa racional normal que temos em relação a elas. Um exame da primeira pessoa deve explicar porque a necessidade de alguém confiar em evidência comportamental para expressar seu estado mental sugeriria algo errado com ele, algum estado de dissociação, e levantaria dúvidas sobre a racionalidade daquelas atitudes que não lhe são acessíveis no modo "imediato" normal. (p. 68)
There are two styles of philosophers: e.g. philosophers and i.e. philosophers—illustrators and explicators. Illustrators trust, first and foremost, striking examples, in contrast with explicators, who trust, first and foremost, definitions and general principles. Explicators may use examples, but their examples are stylized and are more like those that appear after i.e. than the genuine examples that follow e.g. The illustrators, for their part, run the risk of using examples as little anecdotes that serve no philosophical purpose. The dangers of each style are clear and almost unavoidable; yet, I believe that style in philosophy matters greatly. When examples are apt, they are illuminations, not just didactic illustrations. When definitions are good, they are explications, not mere stipulations. I see merit in both styles, but by temperament if not by conviction I subscribe to e.g. philosophy. (p. ix)Tradução:
Há dois estilos de filósofos: filósofos por exemplo e filósofos isto é—ilustradores e explicadores. Ilustradores confiam, antes e sobretudo, em exemplos notáveis, ao contrário de explicadores, que confíam, antes e sobretudo, em definições e princípios gerais. Explicadores podem usar exemplos, mas seus exemplos são estilizados e são mais como aqueles que aparecem após isto é do que os exemplos genuínos que se seguem a por exemplo. Os ilustradores, de sua parte, correm o risco de usar exemplos como pequenas anedotas que não servem a nenhuma finalidade filosófica. Os perigos de cada estilo são claros e quase inevitáveis; contudo, eu acredito que o estilo em filosofia é muito importante. Quando os exemplos são apropriados, eles são iluminações, não apenas ilustrações didáticas. Quando as definições são boas, elas são explicações, e não meras estipulações. Eu vejo mérito em ambos os estilos, mas por temperamento se não por convicção eu me subscrevo à filosofia por exemplo. (p. ix)
Now we can (1) define our guiding problem, (2) create a reading list, (3) cut the primary bibliography in 1-5 pages chunks, (4) divide the presentational-reporting labor.
1. Following Jonadas, Alexandre and Renato, our guiding question is:
Does "I" refer?
Renato summarized some central answers:
- For Ryle (1) there is no privileged self-access, so (2) there is no difference between self-reference and third person reference;
- For Anscombe (1) Cartesian first person privileged access and Rylean behaviorism are wrong, (2) and "I" doesn't refer;
- For Shoemaker (1) the first person has immunity to error through misidentification, (2) and "I" does refer;
- Perry gives us an account of some peculiarities of "I";
- For Evans there are problems in Anscombe and Shoemaker explanations.
2—4. Following Renato and Jonadas, our reading list can be:
0. Wittgenstein, excerpts of The Blue Book – x pages, Jonadas
1. Ryle, "Self-knowledge" – 20 pages, ?
2. Anscombe, "The First Person" – 20 pages, ?/Cesar
3. Shoemaker, "Self-Reference and Self-Awareness" – 15 pages, Cesar
4. Perry, "The Problem of the Essential Indexical" – 20 pages, ?
5. Evans, "Self-Identification" – 25 pages, ?/Cesar
Our reading list has more than 100 pages of primary reading. In my opinion that's a problem, but we have a very good reading list, and would be a shame don't read and discuss all these papers. As a solution I suggest that we don't discuss the selected papers in their full length. The group members charged with the presentation of the texts have to elect to reading and discussion just the parts of the text that give some direct answer to our question (does "I" refer?). Or we can read the papers in their full length. It can work. We are very motivated guys.
Best,
--Eu ainda não li o texto do Paulo, mas gostei muito dos teus comentários, entre outras coisas, pois apontam na direção correta (que também o Alexandre apresenta no final do texto dele) para o entendimento da relação entre idealismo e realismo. Estou lidando com isso em minha tese. O meu problema não diz respeito diretamente a Wittgenstein, mas acredito que W. pode ajudar a pensar uma resposta para o problema. Vou formulá-lo do modo que me parece mais fácil e talvez voce possa me ajudar a ver algo que não estou vendo.
Que bom que achas que estamos indo na mesma direção. É bom discordar e discutir temas filosóficos, mas de vez em quando um acordozinho não faz mal nenhum! Vou fazer comentários pontuais ao que dizes e ao final vejo se consigo elaborar algo mais sistemático sobre o tema.Voce sabe que Descartes distingue entre "uso da vida" e "investigação da verdade". Numa possível interpretação dessa distinção (muito frouxa) poderia ser dito que, no que respeito ao uso da vida, as condições para dizer que "sabemos" algo podem ser entendidas como determinadas ou informadas pelos nossos interesses e propósitos práticos. De outra parte, na investigação da verdade, o que buscamos é a determinação das condições sob as quais é possível dizer que "sabemos" algo, de um ponto de vista puramente lógico ou racional, alheio ao que costumamos fazer com nossas palavras.
Concordarias em "traduzir" essa distinção cartesiana entre "investigação da verdade" e "uso da vida" em termos da distinção kantiana entre os níveis "transcendental" e "empírico"de análise do conhecimento? No primeiro caso, o da reflexão filosófica ou transcendental, o que buscamos é definir um padrão para determinar o que conta como conhecimento, ou seja, mais especificamente, determinar quais são as condições fundamentais para que algo se candidate a conhecimento -- no caso específico de Kant, o resultado dessa análise filosófica seria a indicação das condições transcendentais da experiência, que são as formas de nossa sensibilidade e as formas do nosso entendimento, gerando os princípios sintéticos a priori, etc., etc.. Já no segundo caso, o do registro empírico, simplesmente supomos a adequação de nosso conhecimento àquele padrão transcendental mínimo, sem nos preocupar em justificar ou mesmo refletir acerca dele, partindo para a satisfação de nossos interesses práticos, o que se dá, no caso mais extremo, por meio da elaboração de teorias científicas.Não sei como colocar isso direito, mas acho que posso dizer que o filósofo quando pergunta se "sabemos" algo e nas condições mediante as quais podemos dizer que "sabemos" quer, como resultado, a descoberta de algo como " o que é saber" e não das condições sob as quais "dizemos, em virtude de nossas finalidades etc., que sabemos".
Ok, acho que o que disse acima condiz com essa sua maneira de apresentar o interesse do filósofo, em contraposição aos nossos interesses práticos -- ou não?
Por outro lado, como voce mesmo disse, não podemos conceder muito ao idealismo, pois podemos terminar rompendo com o princípio da "sanidade mental' do Guerzoni, isto é, com a idéia de que aquilo que dizemos é verdadeiro ou falso não em função de nossos desejos, mas em virtude das propriedades do mundo.
Claro, esse é o problema metodológico (e exegético também, pelo menos no caso da análise das posições de Kant e Wittgenstein) fundamental com o qual venho me debatendo ultimamente. E como se faz isso? No caso de Kant, atentando para o que ele tem a dizer acerca da contribuição de certos fatos contingentes acerca do mundo, e de nós mesmos nele incluídos como sujeitos empíricos, para dar conteúdo a nossos conceitos, mesmo aos categoriais. No caso de Wittgenstein, atentando ao papel de nossas reações naturais na formação de jogos de linguagem básicos, e também à contribuição do mundo como expressa em Sobre a Certeza. Falei um pouco mais detidamente desses pontos na mensagem anterior, e não irei retomar isso aqui.Ademais, também não podemos conceder muito ao realismo, pois senão o resultado é algum compromisso com o ceticismo (como mostra o livro do Bernard Williams).
De pleno acordo. Um outro livro que apresenta muito bem essa implicação "realismo metafísico" -> "ceticismo" é "Expressing the World: Skepticism, Wittgenstein and Heidegger", do Anthony Rudd (Open Court, Chicago, 2003). Aqui só quero notar que é exatamente esse ponto que Kant também defende ao dizer que o realismo transcendental leva inevitavelmente ao idealismo empírico.Minha pergunta é então: como devemos responder a pergunta pelas condições sob as quais é possível saber algo? Eu estou tentando tratar esse problema numa direção meio idealista (inspirada em Travis, Putnam e Conant), mas o Faria já me disse que concedo demais ao idealismo.
Repetindo um pouco o que eu já disse acima, e (ab)usando mais uma vez do jargão kantiano e wittgensteiniano -- especialmente por economia de palavras -- eu responderia: bem, há duas maneiras de fazer isso, no nível "transcendental" de análise, e dependendo de qual delas você escolher, terá certas conseqüências para a "vida cotidiana", ou o nível "empírico". Se, no nível transcendental, optas por deixar um papel importante ao "sujeito" (digamos, no caso de Wittgenstein, à autonomia da gramática), então é possível explicar a normatividade de nossa linguagem, ou, no caso de Kant, o caráter necessário e a priori de certos princípios do conhecimento humano, e assim o "homem comum" e especialmente o cientista, que não passa de um "homem comum" um pouco mais fodão, poderão fazer o trabalho deles em paz, sem se preocupar com o cético. Se, por outro lado, supuseres que nossa linguagem e o mundo são coisas completamente distintas, e que à primeira não cabe mais do que "imitar" o segundo, então não terás uma garantia a priori de "acordo" entre os dois, e estarás sempre sujeito aos ataques céticos.
Sei que isso é muito esquemático, mas de todo modo penso que sua questão é muito importante para poder ser tratada adequadamente aqui. O que tentei fazer foi indicar as linhas gerais de como encaro o problema em pauta, e às quais cheguei depois de muito me bater lendo Kant e Wittgenstein. Ainda não estou completamente satisfeito com os detalhes, mas acho que não seria fácil me convencer a abrir mão dessas linhas gerais.(A propósito, Wittgenstein tem uma passagem belíssima, que é citada no livro do Schulte-não lembro onde ela aparece-, onde ele compara o trabalho do filósofo com o de um botânico que tenta mostrar que a rosa é algo para ser entendido "puramente" como um flor de um tipo tal, e não que ela pode ser usada na lapela, como um gesto de amor e atenção, etc.)
Também gosto dessa passagem, e do livro do Schulte como um todo.Tem uma imprecisão na minha mensagem: onde digo "A segunda formulação (na última frase entre aspas) é uma formulação idealista, pois faz que as condições de verdade de nossos conceitos repousem ou tenham alguma sorte de vinculação com nossas práticas (forma de vida, acho que W. diria)". Eu gostaria de dizer: A segunda formulação não é necessariamente idealista, depende de como entendemos a contribuição de nossas práticas.
Pois é, o problema é achar que "idealismo" e "realismo" são denominações auto-explicativas, quando o que acontece é exatamente o contrário. É pouco produtivo ficar discutindo se uma posição é ou não "idealista", sem antes ter clareza sobre o conteúdo da mesma. Mas, supondo que conhecessemos o conteúdo da posição kantiana, por exemplo, aí teríamos que distinguir pelo menos dois sentidos de "realismo" e "idealismo" -- o transcendental e o empírico -- sendo que essa posição seria idealista no primeiro sentido, e realista no segundo.Aguardo suas manifestações a respeito!
Abraço!
Jônadas