quarta-feira, março 21, 2007

Wittgenstein sobre a natureza e método da filosofia

Segue a tradução de uma passagem das Cambridge Lectures na qual Wittgenstein trata da natureza e método da filosofia:

A filosofia pode começar com o bom senso, mas ela não pode permanecer no bom senso. Para dizer a verdade, a filosofia não pode começar com o bom senso porque a tarefa da filosofia é livrar-nos daquelas perplexidades que não surgem do bom senso. A nenhum filósofo falta bom senso na vida cotidiana. Por isso os filósofos não devem tentar apresentar posições idealistas ou solipsistas, por exemplo, como se elas fossem absurdas---indicando a alguém que apresenta essas posições que ele não se pergunta realmente se o bife é real ou se é uma ideia em sua mente, se sua esposa é real ou se apenas ele é real. É claro que ele não faz isso, e essa não é uma objeção adequada. Não se deve tentar evitar um problema filosófico apelando ao bom senso; ao invés disso, deve-se apresentá-lo de modo que ele surja com força máxima. Você deve deixar-se arrastar para a lama, e sair dela. Pode-se dizer que a filosofia consiste em três atividades: ver a resposta de bom senso, ingressar tão profundamente no problema que a resposta de bom senso se torne inaceitável, e voltar dessa situação à resposta de bom senso. Mas a resposta de bom senso em si mesma não é uma solução; todos sabem disso. Não se deve em filosofia tentar curto-cirtcuitar os problemas. (Wittgensteins Lectures: Cambridge 1932--1935; pp. 108--109)

sexta-feira, março 02, 2007

Wittgenstein sobre a dificuldade da filosofia

Como eu disse várias vezes, a filosofia não me leva a nenhuma renúncia, posto que não me abstenho de dizer nada, mas apenas abandono uma certa combinação de palavras como sem sentido. Em outro sentido, contudo, a filosofia requer uma resignação, mas que é do sentimento e não do intelecto. E talvez seja isso que a torna tão difícil para muitos. Pode ser difícil não usar uma expressão, assim como é difícil segurar as lágrimas num acometimento de raiva. (PO, p. 161)

[...] O que torna um assunto difícil de entender – se ele é significativo, importante – não é que alguma instrução especial sobre coisas abstrusas seja necessária para compreendê-lo. Trata-se antes do contraste entre o entendimento do assunto e o que a maioria das pessoas quer ver. Por causa disso as coisas que são mais óbvias podem se tornar as mais difíceis de compreender. O que devemos sobrepujar não é uma dificuldade do intelecto, mas da vontade. (PO, p. 161)

O trabalho em filosofia é [...] mais como uma espécie de trabalho em si mesmo. Na própria auto-concepção de cada um de nós. No modo como vemos as coisas. (PO, p. 161-3)

Uma das maiores dificuldades que encontro ao explicar o que quero dizer é esta: você está inclinado a colocar nossa diferença de um modo, como uma diferença de opinião. Mas não estou tentando persuadir você a mudar sua opinião. Estou apenas tentando recomendar uma espécie de investigação. Se há uma opinião envolvida, minha única opinião é que essa espécie de investigação é imensamente importante e muito contrária à inclinação [against the grain] de alguns de vocês. (WLFM, p. 103 -- trecho de um diálogo com Turing)

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REFERÊNCIAS:

(PO) Philosophical Occasions: 1912-1951. Indianapolis and Cambridge: Hackett, 1993.
(WLFM) Lectures on the Foundations of Mathematics. From the notes of R.G. Bosanquet, Norman Malcolm, Rush Rhees, & Yorick Smythies. Cora Diamond (ed.). Chicago: University of Chicago Press, 1975.As Investigações Filosóficas de Wittgenstein