Grupo de trabalho Ceticismo
Jonadas Techio
Anti-individualismo e Autoconhecimento: uma solução não deflacionária
O anti-individualismo é a posição filosófica que sustenta que os conteúdos dos pensamentos, estados e eventos mentais de um sujeito são constituídos, pelo menos parcialmente, por fatores que se encontram fora de sua mente, no `mundo externo', dos objetos físicos e das relações sociais com outros seres humanos. Ao sustentar essa tese, o anti-individualismo aparentemente fica imune a alguns dos principais problemas herdados da tradição individualista, tais como o da explicação do contato entre a `mente' e o `mundo', e do conhecimento do conteúdo dos estados e eventos mentais de outros sujeitos. Mas esse modelo tem suas próprias dificuldades. Uma das mais relevantes concerne à explicação do autoconhecimento de estados e eventos mentais. Esse problema se apresenta mais claramente na análise de casos como o das `mudanças lentas' de ambiente (slow-switching), em situações exemplificadas pelo experimento imaginário da Terra Gêmea de Hilary Putnam. Em tais casos, uma pessoa poderia ter pensamentos com conteúdos diferentes durante as mudanças (e.g., sobre água num caso e sobre água-gêmea no outro), mas ser incapaz de comparar as situações e notar quando e onde as diferenças ocorreram. A conclusão seria que a pessoa pode não saber que pensamentos tem a menos que proceda a uma investigação empírica de seu ambiente. Uma vez que tal conclusão contraria algumas das intuições mais profundas que temos acerca da natureza do autoconhecimento psicológico, ou bem ela nos obrigaria a abandonar aquelas intuições, ou bem a concluir, por uma espécie de redução ao absurdo, que a posição anti-individualista é falsa. Para alguns defensores do anti-individualismo, contudo, há ainda uma terceira via, que consiste em sustentar a compatibilidade entre o anti-individualismo e a concepção ordinária do autoconhecimento psicológico. Um dos principais defensores da chamada `posição compatibilista' é Tyler Burge. Na presente comunicação apresentarei a discussão entre Burge e um de seus principais críticos, Paul Boghossian. Concluo que a posição final de Burge está imune às críticas de Boghossian, mas que, não obstante, não explica satisfatoriamente o que há de peculiar na relação que um sujeito racional mantém com o conteúdo de seus estados mentais, apresentando-a (i) como uma espécie de postura de `testemunha privilegiada' do sujeito sobre esses estados, e (ii) tratando a autoridade da primeira pessoa como um mero requisito ou pressuposição para a racionalidade. Argumento que uma explicação mais substancial, nos moldes daquela apresentada por Richard Moran e complementada por Lucy O'Brien – em termos da exigência de um tipo de envolvimento do sujeito com suas atitudes, comparável ao envolvimento do agente racional em relação às suas ações – é mais promissora como solução para o problema do autoconhecimento psicológico.
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