sábado, dezembro 03, 2005

Dicas metodológicas no Blue Book

Uma das grandes vantagens do Blue Book em relação às Investigações Filosóficas é que naquela obra Wittgenstein explicita o procedimento ou metodologia de sua filosofia, enquanto nessa última ele apenas o emprega. Alguns exemplos claros de dicas metodológicas que pude recolher são os seguintes:

  1. Ao invés de investigar a natureza do significado de uma expressão, investigar como uma explicacao do significado dessa expressao se parece, i.e., quais sao as maneiras possiveis de se ensinar a usar essa expressao; isso traz a questao do significado ``de volta para a terra'', e nos livra da tentacao de buscar um tipo de objeto que corresponda ao significado (p. 1)
  2. Substituir o apelo a `processos mentais' e/ou `feitos da imaginacao' por atos de observacao de objetos externos reais em explicacoes do que da o significado (``vida'') para certos sinais (p. 4) --- e.g., ao inves de pensar em `imagens mentais' de cores, pensar num sujeito que porta consigo um cartao de cores (p.3), ao inves de pensar em regras `mentais' para calcular, jogar xadrez, etc., pensar no uso de numa tabela de regras escritas (p. 13).
  3. Fugir da tentacao de interpretar palavras analogamente, simplesmente porque elas possuem formas gramaticais prima facie analogas em nossa linguagem ordinaria --- e.g., `pensar' e `pensamento' sao prima facie analogas a `escrever', `falar', etc., e por isso nos fazem buscar por atividades, diferentes mas analogas a estas ultimas (p. 7)
  4. Inventar jogos de linguagem que indiquem formas mais simples ou primitivas de linguagens, nas quais certos tipos de pensamento ``aparecem sem o pano de fundo de processos altamente complicados'' de nossa linguagem efetiva. ``Quando olhamos para tais formas simples de linguagem a nevoa mental que parece envolver nosso uso ordinario da linguagem desaparece. Vemos atividades, reacoes, que sao bem definidas e transparentes. Por outro lado reconhecemos nesses processos simples formas de linguagem nao separadas por um corte das nossas mais complicadas.'' (p. 17)
  5. Abandonar a busca pela generalidade --- o que implica, dentre outras coisas: (a) nao buscar algo comum a todas as entidades que subsumimos a um termo geral; (b) nao buscar uma imagem geral por tras do uso de um termo geral; (c) abandonar o modelo cientifico de investigacao --- i.e., parar de buscar explicacoes redutivas e generalizacoes: a ``filosofia é realmente `puramente descritiva' '' (cf. pp. 17--19).
  6. ``Se você está confuso sobre a natureza do pensamento, crença, conhecimento, e coisas parecidas, substitua o pensamento pela expressão do pensamento, etc. A dificuldade que há nessa substituição, e ao mesmo tempo toda a importância dela, é esta: a expressão da crença, pensamento, etc., é apenas uma frase; --- e a frase tem sentido apenas como um membro de um sistema de linguagem;'' (p. 42)

4 comentários:

Anônimo disse...

Mazá ex-vizinho, até blog de Filosofia tu tem! Bem interessante. Mas não sei o que tu fez no template, ficou meio ruim de ler.
Bjs

Jônadas disse...

Obrigado. Sobre o template, estou fazendo algumas experimentações esporádicas, aí acabo deixando de um jeito até dar vontade de fuçar de novo, mas um dia chego lá, hehe. Tb não me preocupo muito pois acho q sou um dos poucos leitores! Um abraço.

Anônimo disse...

Você vê alguma relação entre os jogos de linguagem de Wittgenstein e os experimentos mentais externalistas?

Jônadas disse...

Certamente há similaridades César. Primeiramente, há similaridades de objetivo: W. explicitamente se propõe a N.B., inventar jogos de linguagem, para clarificar nosso próprio uso de conceitos, e uma das conclusões principais dessa estratégia é justamente a demonstração de como esses conceitos dependem de características relacionais, `externas', para seu significado. Em segundo lugar, há importantes similaridades na própria construção desses jogos de linguagem, em relação aos experimentos externalistas. W. afirma explicitamente que ``Um dos principais métodos que eu uso é o de imaginar um desenvolvimento histórico para nossas idéias [leia-se aqui, conceitos] diferente do que efetivamente ocorreu'' (Culture and Value, p. 37). Assim, em vários momentos, ele fala de como nossos conceitos seriam diferentes se nossa história natural mudasse, e isso está muito próximo do experimento da Terra Gêmea por exemplo. Em outros momentos ele imagina outras comunidades linguisticas e novos usos para os conceitos, e nesses casos se aproxima bastante da estratégia do Burge.